Engenheiro alagoano constrói mais um carro artesanal na própria garagem. Dessa vez a escolha do modelo foi um “Ford A” 1930 ////
Qual o preço de um sonho? Até que ponto vale à pena se esforçar por um feito especial? Questões como essas parecem não ter respostas, já que os valores das paixões não podem ser mensurados.
Em outras duas ocasiões aqui, já mostrei o trabalho artesanal de alto padrão do Engenheiro Mecânico Marco Antônio Gonçalves Pontes. Dr.Marco, um estudioso das marcas Jeep e Ford, nos últimos anos construiu – à mão – na garagem da própria casa, duas réplicas perfeitas dos jipes nacionais 1951 e 54. Os dois veículos são extremamente exatos aos originais e foram dados de presente a seus filhos homens.
Após essas árduas missões que consumiram anos de labuta e muito suor, a coisa parecia ter chegado ao fim, mas um novo panorama surgiu: o casamento de sua única filha. Nesse caso, o propósito era igualmente importante, mas tinha um teor especial: o de levar a noiva até a porta da igreja à bordo de uma réplica de um Ford A de 1930. Acredite: a ideia foi colocada em prática e o veículo ficou pronto praticamente dois anos e meio depois, somente a algumas horas da moça subir ao altar. Mas ele conseguiu.
Mãos à obra >> “A primeira dificuldade que tive foi a de saber exatamente quais as medidas exatas e os tamanhos das partes que iriam compor o carro. Apesar de existirem muitas informações na internet, vários detalhes técnicos do projeto original não foram encontrados. O jeito foi pedir ajuda aos amigos e um deles, chamado Aurélio Backo, proprietário de uma empresa que fabrica réplicas de carrocerias Ford em fibra de vidro, me ajudou muito. Também verifiquei de perto alguns detalhes num Ford A original do saudoso amigo Ênio Barbosa. Esse foi o ponto inicial: colocar o projeto no papel para poder transformar isso em realidade”, explica Marco Pontes.
Partindo do zero >> Bate daqui, corta dali, serra acolá… É bem difícil imaginar que de algumas folhas de chapa metálica, possa surgir um veículo em escala real. A escolha do modelo deu-se pela paixão do proprietário pelo Ford “A” de duas portas na versão “Phaeton Deluxe”, ano 1930. Essa série teve apenas 3.946 unidades fabricadas naquele ano e custava à época cerca de US$ 645 (duzentos dólares a mais que os Fordinhos mais comuns do momento).
“Escolhi esse carro pela beleza da sua carroceria e por ser um pouco diferente dos Ford A que vemos rodando por aí. Naquele tempo a marca americana fabricava 14 tipos de modelos diferentes, mas esse é o que mais me agrada”, ressalta o engenheiro.
Quebra cabeças >> Fui testemunha ocular dos longos meses de trabalho necessários para a gestação desse carismático brinquedo. A estrutura do cockpit se assemelha a de um barco, principalmente a traseira que lembra demais a popa de uma antiga embarcação.
Procurar no Brasil peças mecânicas e complementos originais de acabamento para esse carro é uma tarefa praticamente impossível, dada a escassez desse tipo de atividade construtiva e também pela limitada cultura do antigomobilismo no país. Aí é que entra a inventividade e o talento de alguns brasileiros como o obstinado engenheiro Marco Pontes.
Arte nas mãos >> O cãozinho veloz que enfeita a tampa do radiador dessa réplica, assim como as rodas raiadas que calçam o modelo são, a meu ver, as cerejas que finalizam o sofisticado bolo. São peças inacreditavelmente bem feitas. Outro detalhe que merece aplausos de pé nesse carro é a curvatura exata dos para-lamas.
Olhando o serviço pronto, julga-se fácil a obra tão complicada. Nesse caso, um experimento em madeira deu lugar a um molde de fibra que, por sua vez, foi materializado em metal. Algo aparentemente simples, mas que, definitivamente, não teve a mãozinha de algum gênio da lâmpada que curte carros antigos.
Mecânica >> A carroceria dessa cópia do Fordinho A foi firmada em cima de uma estrutura de suspensão bem conhecida no Brasil. Como dito: por falta de opção de engenhos originais, Pontes optou pela suspensão do Chevrolet Opala. A transmissão também foi herdada da GM, com as macias engrenagens do Chevette a colaborar no passeio.
Por fim, a caixa de direção escolhida veio do Ford Corcel II e o coração da máquina é um motor VW/Ford CHT de 4 cilindros e 75 hp a gasolina.
Final feliz >> Convite feito, convite aceito. Fui ao casamento e levei a câmera. E não é que a coisa funcionou! O valente Fordinho alagoano subiu com desenvoltura a Av.Governador Afrânio Lages. Esperei atento na frente da Igreja dos Capuchinhos e lá vinha a máquina dobrando a esquina com seus enormes faróis acesos.
Era agora uma coisa viva, um titã ressuscitado a desfilar sob olhares curiosos. Enfim…, o sonho materializado do engenheiro foi a chancela da persistência, a assinatura de mais uma obra talentosa. O pai estava cheio de orgulho, a bonita noiva ampliou o charme do calhambeque, subiu ao altar, disse sim e o final foi feliz… (Fotos: divulgação/FBA)